quinta-feira, julho 27, 2006

Coisas simples (de resolver)

Estou cansada, farta, absolutamente entediada com a "polémica" da pirataria ao blogue do Pacheco Pereira. Em vez de nos maçar com posts de suspense de mau filme de terror ("Atenção...! O problema está quase resolvido...! Não... afinal o estupor do pirata voltou...!"), ou com posts de mafioso de New Jersey a jurar vingança a todo e qualquer badameco que ouse roubar-lhe o blogue, por que não - sim, por que não? - mudar de uma vez o endereço do blogue?

Aqui vão algumas sugestões, com as quais espero merecer um lugar de destaque nos agradecimentos que o senhor doutor já anunciou que vai fazer quando a novela acabar:



http://ninguem-calará-o-abrupto.blogspot.com

http://abrupto-foreveryoung.blogspot.com

http://abrupto-rules-yeah.blogspot.com

http://there-is-an-abrupto-that-never-goes-out.blogspot.com

http://sport-lisboa-e-abrupto.blogspot.com

http://abrupto-clube-portugal.blogspot.com

http://bibliofilia-xadrez-e-abrupto-futebol-clube-de-blogspot-e-ponto-com

segunda-feira, julho 24, 2006

Road map - uma visão do mar

Percorrer centenas de milhas com um mapa em cima das pernas, tentando descobrir o caminho mais sossegado e mais próximo do mar, sempre em estradas labirínticas. O mapa do País de Gales era tão desconhecido como uma representação do sistema linfático do corpo humano, só que em vez de glândulas havia cidades com nomes impronunciáveis, dez consoantes contra uma só vogal, uma língua misteriosa de druidas e árvores milenares. Levava-se horas a percorrer aquilo que no mapa pareciam apenas escassos centímetros, sendo que as placas no meio da estrada tornavam a viagem ainda mais confusa.



Tenby






Em Tenby, uma cidadezinha tomada de assalto por bandos de albatrozes, velhos reformados de chapéu de palha e sapatos ortopédicos arrumavam-se nos bancos de madeira em frente à baía logo de manhã, e aí ficavam todo o dia a beber chá e a falar do império britânico no tempo da rainha Vitória, provavelmente o seu único tema de conversa desde que eram um pouco mais novos do que a rainha Vitória.

Um empregado melancólico e com o cabelo a rarear dispunha vezes sem conta as mesmas chávenas de chá de porcelana florida sobre o tabuleiro, com gestos lentos e pesados, como se a salvação do mundo dependesse da exacta simetria das colheres em relação aos guardanapos de renda branca. Soltava comentários lacónicos sobre quão quente estava o dia, entre suspiros violentos que esvaziavam por completo o seu corpo, com certeza tão bafiento e murcho como o papel de parede descolorado que cobria as paredes do salão de chá.



Hay-on-Wye






Em Hay-on-Wye, a terra que acolhe os bibliófilos compulsivos de todo o mundo com primeiras edições raríssimas, preciosidades poéticas e um nunca acabar de estantes, temas, sótãos, escadas, caves e sub-caves forradas de livros, nenhuma conta bancária sai ilesa. Era com angústia que olhava simultaneamente para o relógio e para o mapa (outro) das livrarias todas que ainda faltava visitar, que era preciso visitar.



O mais tranquilizador foi sentir que todas as milhas entretanto somadas, rente ao mar ou por entre montanhas com carneiros a perder de vista, que passar pela mesma rotunda três vezes até acertar na direcção certa, todo esse aparente desnorte foi a maneira mais encantadora de perder tempo.

sábado, julho 15, 2006

Modo: pausa




Mark Twain disse: "I have found out that there ain't no surer way to find out whether you like people or hate them than to travel with them."

Hemingway disse: "Never go on trips with anyone you do not love."


Sempre gostei do realismo americano.

quinta-feira, julho 13, 2006

Coisas que me deixam confusa

O meu vizinho punk cumprimenta-me com um tímido "boa tarde", para logo a seguir arrotar o hamburguer no elevador. Olho para ele, consternada, e ele sorri com aquela cara cheia de piercings e uma t-shirt dos Ramones. O elevador pára e ele abre a porta para me deixar sair, fazendo uma pequena vénia teatral. Passo pelo rapaz, curvado até ao chão, chegamos à rua e ele desabafa: "Fooodaaaa-se, que calor".

A caminho do carro dou por mim a pensar que tudo isto é normal.

quarta-feira, julho 12, 2006

De Swansea ao Vale de Glamorgan





Hold hard, these ancient minutes in the cuckoo's month,
Under the lank, fourth folly on Glamorgan's hill,
As the green blooms ride upward, to the drive of time;
Time, in a folly's rider, like a county man
Over the vault of ridings with his hound at heel,
Drives forth my men, my children, from the hanging south.

Country, your sport is summer, and December's pools
By crane and water-tower by the seedy trees
Lie this fifth month unstaked, and the birds have flown;
Holy hard, my country children in the world if tales,
The greenwood dying as the deer fall in their tracks,
The first and steepled season, to the summer's game.

And now the horns of England, in the sound of shape,
Summon your snowy horsemen, and the four-stringed hill,
Over the sea-gut loudening, sets a rock alive;
Hurdles and guns and railings, as the boulders heave,
Crack like a spring in vice, bone breaking April,
Spill the lank folly's hunter and the hard-held hope.

Down fall four padding weathers on the scarlet lands,
Stalking my children's faces with a tail of blood,
Time, in a rider rising, from the harnessed valley;
Hold hard, my country darlings, for a hawk descends,
Golden Glamorgan straightens, to the falling birds.
Your sport is summer as the spring runs angrily.




Dylan Thomas, "Hold Hard, These Ancient Minutes in the Cuckoo's Mouth"




terça-feira, julho 11, 2006

Shame, shame, fatal shame

Não me incomoda particularmente que o site I hate Ronaldo mostre vídeos dos "mergulhos" de Cristiano Ronaldo com uma minúcia irrepreensível, que apresente montagens fotográficas com o jogador a saltar de pranchas olímpicas ou vestido de atleta de natação sincronizada. Nem sequer me incomoda a forma como Ronaldo é crucificado por causa do "incidente" da expulsão de Rooney e todas as desgraças que se adivinham para este humilde madeirense. O que me chateia verdadeiramente é perceber que os criadores deste site se deram ao trabalho de ir buscar fotografias (reais) de momentos embaraçosos na vida de Ronaldo. Como esta:





O que dizer sobre isto? Cristiano Ronaldo de peito musculado e depilado em pose de chuleco da Madragoa, tigrão da Bobadela, a ser depenicado por dois homens vestidos de mulher e uma mulher de bigode (Maria Vieira) no programa do Herman José (que, felizmente, não aparece na fotografia). Três travestis, dizia eu, a babarem-se para cima do sorridente imberbe (antes fosse uma montagem). O horror. Ao pé disto, as pieguices, os fingimentos e os mergulhos de Ronaldo parecem coisas dignas. Ao pé disto, a cabeçada de Zidane é um feito absolutamente notável.

Amar o inimigo

Dizer mal de alguém requer perícia e esmero. Se o propósito é enxovalhar outra pessoa, que seja com argumentos e impropérios sagazes, à boa maneira oitocentista, e onde cada palavra funcione como uma bomba-relógio a minar a confiança daquele que é insultado.

Dos inimigos espera-se muito mais do que o ódio simples, banal. Espera-se uma obsessão doentia, um continuado aprumo na maledicência, uma jura eterna de guerra. Ter inimigos é ter uma relação quase conjugal com alguém que nos conhece bem demais, e que por isso mesmo explora as nossas fraquezas com arte e engenho. Não há como não apreciar a fidelidade de um inimigo.

A diferença entre ser e estar

Revelar o suficiente sobre coisas importantes (porque as pessoas à volta estão curiosas) é uma tarefa tão delicada como não revelar demasiado sobre coisas importantes (porque as pessoas à volta são curiosas).

terça-feira, julho 04, 2006

Dedicatórias (2)

Dedica-se vitórias à família, ao advogado e ao manager, músicas à ex-namorada e ao presidente Bush, posts à mulher e à amante, bruxarias ao inimigo e teses de doutoramento ao João Carlos Espada.

Dedicatórias (1)

Neil Hannon dedica o último álbum dos Divine Comedy aos fãs. Os fãs de Divine Comedy perguntam-se quando é que Neil Hannon tem um valente desgosto amoroso para voltar a compor um álbum indiscutivelmente bom.

Os dias felizes não têm história

Pensando cada dia, cada hora
Pensando en ti
Caminando, mi cesta llena de moras
Son para ti
Temprano por la tarde y por la noche
Sueño de ti

Lalalala

Comiendo pera
En Santa María de la Feira
Que placer ir
La gente buena
Solo goza nunca hay pena
Pa' que sufrir
Jugando en el mar, en la arena
Viviendo así



"Santa Maria da Feira", Devendra Banhart


(uma visão muito particular desta cidade que, aparentemente, é uma espécie de Verona portuguesa onde se come pêras e há dias felizes.)