A maioria das pessoas que conheço, ou que vou ouvindo e lendo, ficam em pânico quando alguém lhes pergunta a sua opinião sobre determinado assunto, por mais prosaico que seja. Repare-se na forma eufemística como tanta gente avalia um tema hoje em dia, preferindo dizer "Não desgosto de", "Não acho mal", "Não me parece muito errado", "Não é completamente correcto", "Não sou totalmente a favor", "Não concordo inteiramente com", e por aí fora.
Em todas estas expressões, o advérbio de negação que inicia, triunfante, o discurso daquele a quem é pedida uma opinião, funciona como uma armadura contra o "perigo" da assertividade. E depois os advérbios
relativizantes, cuja única função é minimizar os "estragos" e impedir uma vinculação total com aquilo que, a medo, na verdade se quer mesmo afirmar. Imagine-se o diálogo posterior:
- Mas você não disse que era contra?
- Não, se reparar bem, o que eu disse é que
não era totalmente a favor, o que é bem diferente.
- Ah, com certeza. Então estamos de acordo.
O problema de se usar expressões "neutras" não é o barroco das expressões em si, mas o facto de essa neutralidade ser sinónima de uma necessidade absurda de não ofender ninguém, isto é, de se ser políticamente correcto em todas as frentes. Ora, quando se emite uma opinião - sobretudo em questões determinantes - é bom sinal que alguém se ofenda, pois essa é a maior evidência de que a nossa opinião, além de claramente expressa, foi entendida como uma posição clara, uma manifestação de valores e ideologias que nos definem. E é isso, afinal, que fazem os opositores quando se deparam com alguém que não soube defender o seu lado da barricada com lucidez e determinação: arrasam vorazmente os delicados adverbiozinhos e as boas intenções do adversário.
Assim, a abolição do politicamente correcto como analgésico contra futuras controvérsias é absolutamente vital. Ao dizer de forma honesta e vincada que "sou contra", "acho bem" ou "está errado", espero reacções, contraditórios, discussões pertinentes e inflamações epidérmicas. Sem relativismos, sem escudos, sem anestesias.